domingo, 7 de junho de 2009

Pedinte

A minha casa é a cidade inteira, - falou o mendigo poeta.
O meu teto é o céu que se pinta, muitas vezes, de estrelas. Eu guardo um sonho em cada uma delas. As mais reluzentes são os grandes projetos. Eu espero, sinceramente, realizá-los algum dia.
O meu chão é a rua ao lado da sinfonia inconstante das buzinas dos carros. É o mesmo solo frio que apara os meus sentimentos na hora que o sono vem.
Acordo e nunca estou no mesmo lugar. Entretanto, o labirinto das avenidas não é mais mistério. É enigma para os demais, apenas.
As cicatrizes que carrego nas diversas partes do corpo são indeléveis. Principalmente as que trago no peito. Afinal, pele não é papel. Os traços não somem com borracha.
Escrevo com giz no concreto. Torço para o vento não levar o pó. Se for para levar algo, que me leve dessa vida medíocre e me mostre algo novo.
A moeda que me dão não serve mais.
A manhã, a tarde, a madrugada.
O silêncio.
Depois dos passos apressados, a calmaria.
A elucubração ferina.
A solidão.
Dor renitente que amortiza o coração.
Lamento cantado em tango que ninguém ouve.
Eu quero alguém que me chame para dançar...

7 comentários:

  1. Poxa... Que texto mais lindo... e triste.

    Quero tirar ele pra dançar. :'(

    http://espelhoinverso.blogspot.com/

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  2. Casas ao relento lares sob a imensidão do céu.
    Casas que são mundos de indiferença e solidão.

    Belíssimo texto.

    Abraços,
    Mai

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  3. Só uma nota:
    Eu escrevi esse texto inspirado na primeira frase, quando vi uma entrevista de certo mendigo que agora não recordo o nome.
    Mas fiquei impressionado com a capacidade e a consciência dele.
    Existem sábios (no seu modo de ser e exprimir suas opiniões) na rua e nós nem notamos...

    Um beijo e obrigado vocês pelos comentários!

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  4. aaaai, que alívio!
    voltar a comentar e a blogar!
    escrever é algo que já faz parte de mim.

    belíssima construção textual, Vandré. belíssima mesmo!
    engraçado que mesmo tendo o mundo inteiro em nossas mãos sabemos que devemos conquistar o nosso espaço nele.
    para alguns isso é mais fácil...
    para outros, como o mendigo, com tantas adversidades, é mais difícil...
    agora é sempre semelhante a carência que temos, seja lá do quê ou de quem, ao final do dia.
    sempre queremos chamar um algo ou um alguém para 'dançar', mas nem sempre temos este 'algo' ou 'alguém' para nos preencher.
    mas, olha que contraditório...
    temos um mundo inteiro raiando no outro dia...

    eu estive numa vibe meio 'down' estes últimos dias. mas algo que acabei de ver me fez movimentar meus músculos faciais em dimensão de um sorriso.
    e me deu a esperança de que, sim, há um mundo inteiro raiando no outro dia.

    um dia, há 2 anos atrás, eu estava com um problema muito, muito ruim.
    e um amiga, sem saber o que acontecia, somente me veio e me disse a frase que mais amo. era assim:

    'não importa o que aconteça, nada é como um dia após o outro'.

    para mim, para vc, para o mendigo que te inspira.

    agora eu vou RIR! nem que seja só por hoje. mas vou RIR!

    o Dixt:: vai ficar no stand, mas a minha casa nova é toda sua! ;D

    bj Vandré!

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  5. E do riso caíra a saliva.
    A saliva cairá na terra.
    Da terra brotará a flor.
    Amor...
    :)

    Beijos!!!!

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  6. Voltar e ler teus contra-argumentos aos comentários - réplicas e tréplicas...
    Sempre me deixas com um gosto de quero mais...
    Poeta é isto, faz poesia até quando comenta.

    Beijos.

    Mai

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  7. Porque comentar não é simplesmente tentar elogiar. É tirar a impressão que tens daquila situação formada.
    Obrigado, Mai!

    Um beijo!

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