sábado, 23 de maio de 2009

Agônico

Eu, que ando sempre contra a parede, não saio do lugar.
A força faz brotar o sangue, que transborda do meu cenho e inunda a terra vazia e seca.
Eu não ligo para o que me cerca.
Apenas fechos os olhos e deixo-me guiar.
As costas aguentam os chicotes que cortam a carne, num bailar lúgubre quase imperceptível pelos seres que habitam esse pedaço de chão.

Vejam as caveiras brotarem com o estalar dos ossos outrora hirtos.
Vejam e aplaudam o grito da águia-mortalha.

Outros cairão e não levantarão.
Vigilante, o arqueiro cego, portador da flecha inconsciente, mira sem analisar o coração que no corpo bate.

Eu não movi este muro!
Só angariei uma modorra, que a cada dia me corroi um pouco da esperança contida na alma.

Eu acho mesmo que este local será meu túmulo,
que a parede será minha lápide.
E que o meu epitáfio, escrito com saliva, trará a máxima desconhecida que nenhum olho poderá enxergar.

10 comentários:

  1. O que nos cerca? Cercas, muros, grades, paredes, divisórias? Qual separação nos escravisa? Dominação e submissão?
    Débito e cobrança ou o ressentimento nos escravisa bem mais do que supomos?

    Não saberia responder por ti.
    Mas, aqui neste texto, há o sangue, a parede a cerca, o túmulo e um epitáfio por fim - ao final, tudo e todos - Poderosos ou escravos cotidianos, seremos o mesmo, seremos iguais, queiram, ou não.

    Texto forte!
    Gostei outra vez.

    Abraços,

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  2. O caminho a seguir é o mesmo. Afinal, a morte é o final para todos.
    O que nós que podemos fazer é mudar a rota para obter longetividade, ou mesmo para aproveitar melhor esse espaço de tempo tão curto!

    Obrigado pelo comentário, mais uma vez.
    Um beijo grande!

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  3. Afinal a vida é uma desconfortável submissão, mas poucos o sabem...
    Passa no meu

    ;)

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  4. Sim, porque estamos presos a alguns valores intangíveis.
    Tão solidificados como a rocha mais velha.

    Obrigado pelo comentário.
    Espero que volte.

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  5. E muitas pessoas estão mortas mesmo vivas, porque fizeram da mente sua prisão.

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  6. E quem se aprisiona dessa forma geralmente joga as chaves fora.
    E não volta.
    E não volta...

    Sempre o mesmo disco arranhado.
    Sempre o mesmo tom.

    Beijão Bruna!
    Obrigado pelo comentário!

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  7. lindo, lindo, lindo.
    dá pra casar essa tua postagem com a minha 'homenagem'.

    dominação e dominado.
    e a flecha da verdade disparado por um cegueta.

    já reparou que apenas os cegos são capazes de enxergar realmente?

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  8. Porque a pessoa que não tem visão abstrai de tantas coisas.
    Podiamos fazer esse exercício de observação.
    E silenciar um minuto, talvez dois. Para assim melhorarmos nossa percepção! :)

    Um beijo Sandra, obrigado pelo comentário!

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  9. Esse foi dos fortes! Aproveitei e li os outros que nçao tive tempo antes. Você é fantástico.

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  10. Agradeço demais a audiência.
    Obrigado mesmo pelo comentário!
    Espero que retorne!
    Um abraço!

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